Benvindos ao meu blog. Só mais um para aumentar a comunidade do blogger.
Como o tempo livre é muito e porque adoro ser irónico, (pois afinal de contas o tempo até nem é muito,
mas se o dissesse já não estava a ser irónico e, como acabei por dizê-lo à mesma, acabo por ser irónico ao afirmar que não o era)
é apenas mais um novo projecto na minha vida. Espero que gostem...

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Lá em cima… (primeira parte)

Um dia destes encontrei um novo amigo fã incondicional dos mistérios que se situam fora da nossa atmosfera. É sempre uma alegria enorme que me preenche o coração conhecer alguém que é doido por buracos negros… Por estrelas de neutrões… Por quasares… Por nebulosas… Enfim! Por todos aqueles objectos nos quais não podemos tocar mas que estão lá ao longe. Foi graças a ele que decidi escrever este post e expor aos leitores deste blog o que de mais estranho está lá fora. Aposto que se vai interessar pelo tema tanto quanto eu e vai tentar aprofundar mais os seus conhecimentos acerca do mesmo. Tenho a certeza que sim pois, afinal de contas, quem não fica fascinado pelo nosso universo e pelo que nele existe, é porque ainda não se apercebeu de como ele é…
Vamos começar pelo princípio, não de todos os tempos (deixarei o Big Bang para outra altura) mas sim do mais simples. Se começarmos pelo conceito simples de Estrela, a fazer lembrar o nosso querido Sol, vamos enveredar por um caminho com apeadeiros nos maiores colossos da nossa galáxia, nas nuvens de poeiras e gases (e álcool também) a fazer lembrar borboletas, anéis e pilares, nos pequeníssimos faróis agitados e mortíferos e nos devoradores astros negros pois, de buraco, não têm nada.
O comboio chegou a uma hora perfeita. Vamos?!
ESTRELAS VIVAS PARA TODAS AS CIRCUNSTÂNCIAS
O mecanismo e a variedade das verdadeiras fontes de vida.
Estamos, imagine, no ano 2080. Restam apenas poucas jazidas de petróleo no nosso planeta. Contudo, apesar de ainda existir, a sua extracção cessou por completo. A humanidade sofreu uma autêntica revolução energética, no bom sentido da palavra. Uma fonte praticamente inesgotável permite um avanço tecnológico sem precedentes, electricidade a custos reduzidíssimos e um ambiente sem poluição, nem efeito de estufa, nem buracos na camada de ozono. Estamos no início da Era da Fusão Nuclear. Finalmente o homem conseguiu produzir energia da mesma forma que o nosso Sol produz a sua. Mas como funciona? Bem! Para responder a essa questão, felizmente não é necessário viajar ao futuro… Essa resposta já nós a conhecemos.
Tal como é sugerido na expressão “Fusão Nuclear”, o processo é, de uma forma muito grosseira, um oposto das reacções produzidas nas centrais nucleares existentes na actualidade. Numa central nuclear, substâncias radioactivas, como o urânio, são decompostas em substâncias mais leves. Esse processo baseia-se na fissão nuclear, que significa “divisão do átomo”. Trata-se de uma reacção em cadeia e perigosíssima pois basta, em teoria, um neutrão apenas para desencadear uma explosão fora de controlo. Ao bombardear um átomo de urânio-235 (escreve-se 235U) com um neutrão, o átomo muda a sua massa para 236, isto é 236U, que constitui um átomo instável. Este novo átomo divide-se então em dois mais pequenos. Nesta divisão há libertação de energia armazenada no núcleo-mãe e de mais neutrões livres. Se houver mais urânio, esses neutrões livres libertados vão bombardear novos átomos e provocar uma reacção em cadeia. A energia libertada no processo é então convertida em electricidade se estivermos a falar de uma central nuclear ou numa onda de choque e calor monstruoso se estivermos a falar da bomba atómica. Os átomos restantes, o chamado lixo nuclear, podem ser de vários tipos alguns dos quais bastante perigosos.
No interior de uma estrela a reacção química é, de uma forma geral, contrária a esta. Isto é, átomos pequenos fundem-se em partículas maiores. Nessa reacção existem partículas que se transformam em energia de acordo com a conversão famosa E = mc2, a conhecida equação de Einstein (c representa a velocidade da luz no vácuo: 299792458 metros por segundo). Segundo esta equação, a matéria e a energia são, no fundo, duas formas diferentes da mesma coisa. O seu impacto é avassalador porque implica que a quantidade de energia armazenada numa partícula é enorme.
Façamos umas contas para compreender. Para isso vamos imaginar que conseguimos converter 3 toneladas de lixo em energia com uma eficácia de apenas 1%. A equação de Einstein mostra-nos que a energia libertada pelo processo é igual a:
E = 0,01 x 3000 x 2997924582 = 2.696.265.536.210.452.920 joules
Para compreender a dimensão de 2.696.265.536.210.452.920 joules deixo-lhe a noção de que este valor é aproximadamente o gasto energético em dois dias de TODO o planeta. E isto com uma eficácia de apenas 1%!!
Digamos que, agora, é fácil compreender porque é que o nosso Sol liberta tanta energia, não? Mas para o deixar ainda mais informado, vamos investigar o que se passa no interior da nossa estrela a nível atómico. No interior do Sol a temperatura é tão elevada que o hidrogénio, a partícula mais simples da natureza – constituída na sua forma habitual por um protão e um electrão – ioniza na forma H+.
A sopa de protões livres no interior do Sol constitui aquilo a que os cientistas chamam de plasma, também conhecido por quarto estado da matéria. Chamaremos então aos protões H+ e aos electrões e. É neste momento que a reacção de fusão nuclear vai começar e uma amálgama de partículas novas vão aparecer… A primeira reacção de todas é a fusão de dois protões H+. Quando tal acontece a força nuclear fraca, uma das quatro forças que ditam as leis do nosso universo, transforma um dos protões num neutrão. Podemos inclusive dizer que um dos protões perde a sua carga. Essa carga perdida é libertada na forma de um “electrão especial” pois tem carga positiva. Chamamos a esta partícula positrão ou anti-electrão (e+). Resulta ainda da reacção um neutrino (ve) por cada par de protões fundidos. Os positrões, por sua vez, vão aniquilar-se com os electrões livres resultantes de ionização do hidrogénio, gerando energia de acordo com a equação de Einstein sob a forma de fotões-gama (γ). Ao átomo resultante da fusão dos dois protões chamamos deutério e representamos por 2H.
A reacção continua com a fusão do 2H produzido na primeira fase com um novo protão livre H+. Nesta já não há a perda de carga de protão algum, pelo que o novo átomo terá dois protões e um neutrão. Esta nova partícula é um isótopo leve do hélio (representa-se por 3He). Passou a ser uma nova substância uma vez que o seu número atómico aumentou de 1 para 2 (o número atómico de um átomo é o número de protões do seu núcleo). Desta nova reacção resulta ainda um fotão-gama.
Feitas as contas, no final desta reacção, por cada três átomos de hidrogénio há a produção de um átomo de 3He, um neutrino, dois electrões livres e energia na forma de três fotões-gama. Parece muito pouco comparada com a imensa quantidade de energia libertada pelo Sol… Mas relembre que a nossa estrela possui triliões de triliões de partículas de hidrogénio ionizado… Contudo a reacção completa não termina aqui. Os neutrinos libertados também transportam energia mas estes não interagem com a matéria portanto não afectam nem a temperatura do Sol nem a temperatura do que o rodeia.
Reacções semelhantes de fusão vão transformar os núcleos de 3He em núcleos de 4He constituídos por dois neutrões e dois protões cada um. Esta fase da reacção pode ocorrer de três formas diferentes:
• ANÃS AMARELAS
Esta é a reacção dominante na produção de hélio no nosso Sol que tem uma temperatura, no seu núcleo, compreendida entre os 10 e os 14 milhões de graus centígrados. Dois isótopos leves de hélio (3He) combinam-se e formam um núcleo de hélio estável constituído por dois neutrões e por dois protões. Desta reacção resultam, evidentemente, dois protões livres que podem recomeçar a reacção (a partir da primeira fase) e recombinar-se libertando mais energia.
Além do nosso Sol, existem inúmeras estrelas na nossa galáxia onde esta fase da reacção é dominante (as Anãs Amarelas). Umas das mais idênticas (e mais próximas) é a estrela Tau Ceti a apenas 11,9 anos-luz de distância (113 biliões de quilómetros). Dada a sua parecença com o Sol esta estrela foi uma das primeiras escolhidas por Frank Drake no projecto OZMA que visava detectar sinais de rádio vindos dos espaço e de supostas civilizações alienígenas no início dos anos 60. Apesar da falta de sucesso na obtenção de tais sinais o projecto foi o precursor do conhecidíssimo plano SETI.
ESTRELAS BRANCAS
Nas estrelas um pouco mais quentes que o nosso Sol (com um núcleo temperado entre os 14 e os 23 milhões de graus centígrados) os núcleos estáveis de hélio resultantes da reacção anterior combinam-se com os isótopos 3He. Nesta reacção há formação de elementos mais pesados: um isótopo de berílio (7Be) e um isótopo de lítio (7Li). Estes, por sua vez, dividem-se em átomos de hélio estável num processo de fissão nuclear.
Destas estrelas (normalmente intituladas de Estrelas Brancas), um pouco maiores que o Sol, vou dar destaque a Sirius, a estrela mais brilhante do nosso firmamento. Situa-se ainda mais perto de nós que Tau Ceti, a cerca de 8,6 anos-luz (81,5 biliões de quilómetros). Não é, de todo, a estrela mais brilhante da nossa galáxia. Apenas detém esse título no nosso céu por estar muito próxima. Sirius tem ainda uma pequena estrela companheira (uma Anã Branca) detectável apenas com telescópios de grande resolução dada a diferença entre os seus brilhos. Por existirem indícios de que civilizações terrestres antepassadas já tinham conhecimento do facto de Sirius ser, na verdade, um sistema duplo de estrelas (muito antes da invenção do telescópio), este monstro da constelação de Cão Maior tem sido alvo de especulação pelos seguidores do fenómeno OVNI e inspirado muitos autores de ficção científica.
• GIGANTES AZUIS
Nos núcleos estrelares com temperaturas superiores a 23 milhões de graus centígrados, a fusão mais frequente dos núcleos de 3He em núcleos de hélio estáveis é ligeiramente diferente da anterior. Nesta o isótopo de berílio ganha um protão e transforma-se em boro (8B) que, por sua vez, perde carga e transforma-se num núcleo estável de berílio. A sua fissão posterior origina dois núcleos estáveis de hélio.
É no interior das chamadas Gigantes Azuis que esta reacção é mais frequente. Uma das maiores, que são visíveis a partir do nosso planeta, é Rigel, na constelação de Orionte. Situa-se a 775 anos-luz de distância (7300 biliões de quilómetros). O tamanho de Rigel excede a capacidade imaginativa da mente humana (o seu diâmetro é cerca de 73 vezes maior que o diâmetro do nosso Sol). Em termos relativos, Rigel revela a sua grandiosidade no seguinte esquema comparativo:
A estrela Rigel é facilmente identificada no céu nocturno:
ANÃS VERMELHAS
As reacções de fusão numa estrela são como um ciclo vicioso uma vez que, quanto mais quente for o seu núcleo, mais energia é libertada e, por sua vez, tal energia mantém o núcleo àquelas temperaturas extremas. Essas temperaturas também estão relacionadas com o tamanho da estrela pois quanto maior esta é, mais hidrogénio possui para consumir. É este o factor que justifica a curta vida das estrelas gigantes azuladas, tais como Rigel. Desta forma, uma estrela mais pequena que o nosso Sol é também mais fria (e mais duradoura) uma vez que consome o seu hidrogénio mais lentamente. É neste grupo que se incluem as Anãs Vermelhas, as estrelas mais vulgares na nossa galáxia.
A estrela mais próxima do nosso sistema solar, a Proxima Centauri, é uma Anã Vermelha. Faz parte do sistema triplo de estrelas Alpha Centauri. Infelizmente este sistema não é visível do território português dada a sua declinação.
No esquema a estrela Proxima Centauri é imperceptível. Apenas os telescópios mais potentes conseguem distingui-la. Situa-se a apenas 4,2 anos-luz de distância (40 biliões de quilómetros). Supõe-se que existem até objectos da Nuvem de Oort, a zona periférica do nosso sistema solar, mais longínquos do nosso Sol que da Proxima Centauri. Sem dúvida, o sistema Alpha Centauri será, num futuro indeterminado, o primeiro sistema extra-solar a ser visitado pela humanidade.
ANÃS CASTANHAS
Ainda mais pequenas que as Anãs Vermelhas são as Anãs Castanhas. Estas são tão pequenas que o núcleo nunca atingiu a temperatura suficiente para desencadear a fusão do hidrogénio em hélio. Daí o nome “Estrelas Falhadas”.
Por serem incrivelmente débeis, a sua existência foi confirmada apenas em 1995 pelo telescópio espacial Hubble. Na constelação da Lebre foi detectada uma Anã Castanha a orbitar a estrela Gliese 229. Foi então baptizada de Gliese 229B. Situa-se a 18,8 anos-luz de distância (178 biliões de quilómetros).
FONTE: NASA/JPL (Hubble Space Telescope; 17 de Novembro de 1995; criado por NASA; domínio público)
Na figura está indicado o sistema duplo Gliese 229. A resolução das duas estrelas é apenas possível nos telescópios mais potentes do planeta, entre os quais o famoso Hubble do qual se mostra a fotografia tirada em 1995 que comprovou a existência das Anãs Castanhas.
Relembremos, nesta altura os vários tipos de estrelas activas existentes na nossa galáxia:
OS ÚLTIMOS DESABAFOS ESTELARES
Os verdadeiros titãs e os seus descendentes.
Quando uma estrela consome todo o seu hidrogénio começa a fundir o hélio em elementos mais pesados tais como carbono (C) e oxigénio (O). Estes elementos são fundamentais na estrutura das moléculas orgânicas! Na verdade supõe-se que os elementos que deram origem à vida existentes na sopa primordial do nosso próprio planeta foram criados, efectivamente, nos núcleos de estrelas ainda mais antigas que o nosso sistema solar.
GIGANTES VERMELHAS
Esta nova reacção de fusão, que se começa a realizar no núcleo estelar, é ainda mais energética que a fusão do hidrogénio em hélio. Tudo começa com a fusão do hélio em carbono, reacção de onde resultam dois fotões-gama altamente energéticos.
Numa segunda fase da reacção, os núcleos de carbono combinam-se com núcleos de hélio dando origem a núcleos de oxigénio resultando desta nova fusão mais um fotão-gama.
Quando isto acontece começa a formar-se uma bomba-relógio que pode terminar numa explosão colossal. Isto porque, à volta do núcleo, ainda existe hidrogénio a fundir-se em hélio. A energia libertada pela fusão do hélio expande as camadas superiores e a estrela aumenta de tamanho. Entretanto, a formação de elementos mais pesados no núcleo faz com que este se contraia devido à gravidade. Origina-se assim uma camada, entre o núcleo e o exterior, menos densa que estes. Se a estrela for muito grande a camada exterior acaba por colapsar sobre o núcleo e a estrela explode. Nas estrelas menos maciças, como o nosso Sol, a massa exterior não é suficiente para colapsar e a estrela acaba por arrefecer lentamente.
Prevê-se que o nosso Sol comece a sua fase de inflação, transformando-se numa Gigante Vermelha, daqui a cerca de 4 biliões de anos. Nessa fase, o Sol vai aumentar tanto que engolirá os planetas Mercúrio e Vénus. Em relação à Terra, os astrónomos não conseguem prever o que irá acontecer. Ao que tudo indica a posição do nosso planeta marca efectivamente o limite previsto para o aumento do Sol.
Uma das Gigantes Vermelhas mais famosas visíveis no nosso céu nocturno é Aldebaran, na constelação do Touro. Esta estrela representa precisamente o olho do touro, vermelho e enraivecido. Situa-se a 65 anos-luz de distância (615 biliões de quilómetros). O seu diâmetro é cerca de 44 vezes maior que o diâmetro do Sol.
NEBULOSAS PLANETÁRIAS E ANÃS BRANCAS
A estrela Aldebaran é uma gigante pulsante o que sugere que já está a atravessar a segunda fase da sua inflação. Nesta, o hélio no núcleo estelar acaba por se consumir por completo. Começam então a formar-se átomos ainda mais pesados a partir da fusão do carbono e do oxigénio. Daqui resultam elementos como o Magnésio (Mg), o Sódio (Na), o Néon (Ne), o Silício (Si), o Fósforo (P), o Enxofre (S) e, em última instância, o Ferro (Fe), entre outros. Nesta fase o núcleo estelar aquece ainda mais e, na camada à volta do núcleo, onde outrora o hidrogénio se fundira em hélio, este começa agora a queimar-se em carbono e oxigénio. Nas camadas mais afastadas do núcleo, o hidrogénio começa a fundir-se em hélio. É durante esta altura que a estrela utiliza os recursos das três reacções em simultâneo, o que faz com que aumente ainda mais de tamanho agora de uma forma semelhante a um balão, inchando mais rápido durante alguns períodos (como quando nós expiramos para dentro do balão) e parando a sua inflação durante os outros intervalos de tempos (como quando nós inspiramos). É preciso ter sempre presente que os materiais pesados que vão sendo produzidos vão também “caindo” em direcção ao núcleo da estrela dado o efeito da gravidade.
Durante a fase de gigante vermelha pulsante, a estrela é tão quente e energética que expulsa a sua camada superior em direcção ao espaço. Estes gases acabam por arrefecer e formam uma nuvem esférica em torno da estrela. Os astrónomos chamam esta nuvem de Nebulosa Planetária. O termo planetária nada tem a ver com planetas. Provém apenas da sua semelhança com os gigantes gasosos do sistema solar à luz das oculares dos primeiros telescópios. As nebulosas planetárias são dos objectos mais interessantes que se podem visualizar com um telescópio. É por isso que deixo aqui três exemplos (o mais difícil foi escolher apenas três).
FONTE: NASA/JPL AURA/STScl (Hubble Space Telescope; Outubro de 1998; criado por NASA; domínio público)
A Nebulosa do Anel é uma das nebulosas planetárias mais famosas. Situa-se a 1800 anos-luz do nosso sistema solar (17 mil biliões de quilómetros). Foi descoberta em 1779 pelo astrónomo francês Antoine Darquier de Pellepoix.
FONTE: NASA/JPL J.P.Harrington/K.J.Borkowsky U. Mariland (Hubble Space Telescope; 18 de Setembro de 1994; criado por NASA; domínio público)
A Nebulosa do Olho de Gato situa-se a 3000 anos-luz do nosso sistema solar (28 mil biliões de quilómetros). É uma das nebulosas mais intensas visíveis a partir do nosso planeta. A estrela no centro da nebulosa é 10.000 vezes mais brilhante que o nosso Sol.
FONTE: NASA/JPL AURA/STScl (Hubble Space Telescope; 24 de Janeiro de 2000; criado por NASA; domínio público)
A Nebulosa do Palhaço situa-se a 2500 anos-luz de distância (24 mil biliões de quilómetros). Foi descoberta pelo astrónomo inglês William Herschel em 1787.
Durante a fase de gigante vermelha pulsante uma estrela pode apresentar um disco de acreção. Tal pode dever-se a uma rápida velocidade de rotação ou a um desequilíbrio na homogeneidade da massa estelar (casos muito frequentes quando se tratam de sistemas binários de estrelas). Se tal acontecer, a matéria expulsa pela estrela tende a surgir dos pólos da mesma, de acordo com o seu eixo de rotação. É nestes casos que surgem as Nebulosas Planetárias Bipolares, nuvens de gases formadas por dois lobos opostos. São tão bonitas que não podia deixar de mostrar as minhas três favoritas.
FONTE: NASA/JPL Hubble SM4 ERO Team (Hubble Space Telescope; 27 de Julho de 2009; criado por NASA; domínio público)
A famosa Nebulosa da Borboleta dista 3800 anos-luz de distância (36 mil biliões de quilómetros). Trata-se de uma nebulosa planetária gigantesca, com 2 anos-luz de extensão (metade da distância do nosso Sol até Próxima Centauri). Os gases expandem-se a uma velocidade estimada de um milhão de km/h.
FONTE: NASA/ESA (Hubble Space Telescope; 18 de Outubro de 2006; criado por NASA; domínio público)
A Nebulosa NGC 2346, a 2000 anos-luz de distância (19 mil biliões de quilómetros) alberga no seu centro as duas estrelas que lhe deram origem. Trata-se de um sistema binário em rápida rotação por estarem muito perto uma da outras – demoram cerca de duas semanas a dar uma volta completa em torno uma da outra. Neste caso a gigante vermelha não cresceu o suficiente para engolir a sua companheira. Contudo fê-la cair para uma órbita mais baixa.
FONTE: NASA/ESA (Hubble Space Telescope; 17 de Dezembro de 1997; criado por NASA; domínio público)
A Nebulosa Saturno situa-se a a 25.000 anos-luz de distância (237 mil biliões de quilómetros). Trata-se de uma nebulosa bastante controversa pois é difícil de classificar. Dada a sua forma alongada, no entanto, a maior parte dos astrónomos considera-a uma nebulosa bipolar. A sua estrela central aparenta ser cerca de 20 vezes maior que o nosso Sol.
Após a fase da expulsão das camadas superiores de uma gigante vermelha e da criação de uma nebulosa planetária, o material resultante condensa-se no núcleo estelar formando uma estrela muito pequena, mas muito branca e brilhante. É neste grupo que se incluem as Anãs Brancas. Estas estrelas, que atravessam agora o último glamour da sua vida, são incrivelmente densas e pesadas. Uma colher de chá de matéria retirada de uma Anã Branca pode chegar a pesar tanto como um autocarro de dois andares. É essencialmente constituída por carbono e oxigénio resultantes da reacção de fusão do hélio durante a fase de gigante vermelha. Por serem extremamente pequenas, as Anãs Brancas são extremamente morosas no que diz respeito ao consumo do seu combustível. Prevê-se que uma Anã Branca transforma-se lentamente numa Anã Negra mas esse processo é tão demorado que estima-se que ainda não existam Anãs Negras no universo conhecido. Este não é velho o suficiente para albergar Anãs Brancas apagadas.
Uma das Anãs Brancas mais fáceis de reconhecer no céu nocturno é a 109 Virgo, na constelação de Virgem. Trata-se de uma estrela branco-azulada a 130 anos-luz do nosso sistema solar (1230 biliões de quilómetros).
SUPERGIGANTES VERMELHAS
Existem gigantes vermelhas que são tão grandes que tiveram que criar o seu próprio sistema de classificação. É, aliás, neste tópico que vamos encontrar as maiores estrelas conhecidas pelo homem. O seu tamanho não só deu origem a um novo nome, como também origina um final estrondosamente diferente em relação às vulgares gigantes vermelhas. As reacções químicas nos seus núcleos são essencialmente iguais às dos núcleos das gigantes vermelhas de «tamanho normal». No entanto, as espessuras das camadas estelares são maiores e existe uma maior diferenciabilidade entre as suas densidades. Tal facto origina um colapso estelar em direcção ao núcleo e uma explosão gigantesca por vezes capaz de ofuscar uma galáxia inteira. Este fenómeno chama-se Supernova e acontece apenas com estrelas cuja massa é superior a sete massas solares.
Tal como numa gigante vermelha, a energia libertada no núcleo expande as camadas exteriores onde ainda se processa a fusão do hélio e do hidrogénio. Se a estrela for muito massiva o peso da camada exterior origina um colapso em direcção ao centro da estrela devido a diferença de densidades nas várias camadas estelares. Uma supernova é praticamente imprevisível, apesar de existirem alguns casos prometidos para breve. Um desses casos chama-se Betelgeuse, uma gigantesca estrela vermelha na constelação de Orionte. Fica a apenas 430 anos-luz de distância (4 mil biliões de quilómetros).
Existe uma grande controvérsia em relação a Betelgeuse. A comunidade científica divide-se entre aqueles que acreditam que a sua explosão está para breve (algures nos próximos mil anos) e outros que acreditam que a sua longevidade é muito maior. O meu coração suplica que Betelgeuse dure apenas alguns anos e que eu seja contemplado com o deslumbre da sua supernova. Prevê-se que, apesar da sua proximidade e do seu tamanho – na realidade, Betelgeuse é tão grande que, durante as fases pulsantes de maior inflação, se estivesse no lugar do nosso Sol o seu tamanho ultrapassaria a órbita de Marte – a sua explosão não constitua risco algum para o nosso planeta. Mas é certo que irá contemplar-nos com um esplendor memorável!
Ainda maiores que Betelgeuse são as conhecidas estrelas μ Cephei e vv Cephei, ambas na constelação de Cefeu. μ Cephei é uma supergigante muito avermelhada. A sua cor, muito apreciável com a ajuda de um pequeno telescópio, difunde o espaço à sua volta em tons de vermelho. Descoberta por William Herschel, este deu-lhe o nome de Estrela Granada. Situa-se a 3000 anos-luz de distância (28 mil biliões de quilómetros). O seu diâmetro pode chegar a 1800 diâmetros solares, o que não chega aos 2000 diâmetros solares atingidos por vv Cephei. Esta gigante vermelha é tão grande que no lugar do nosso Sol chegaria à órbita de Júpiter. Situa-se a 8400 anos-luz do nosso sistema solar (80 mil biliões de quilómetros).
Relembremos agora os tipos de gigantes vermelhas existentes lá em cima:
Quando estas supergigantes colapsarem sobre o seu próprio núcleo podem dar origem a variados objectos: desde nebulosas a buracos negros. O colapso estelar pode também libertar mortíferas explosões de raios-gama (uma verdadeira ameaça ao nosso planeta). Estrelas de neutrões podem surgir de tais explosões e mais explosões de raios-gama podem resultar de colisões entre estrelas de neutrões. Apesar de mortíferas, as supernovas são também fontes de vida e, em algumas nebulosas da nossa galáxia, podemos assistir ao mágico momento do nascimento de novas estrelas. Dessas poderão surgir planetas talvez até capazes de gerar vida. É aqui que vai recomeçar um novo ciclo e uma nova lista de objectos deve ser criada. Uma lista que carinhosamente vou intitular de “Lá em cima… (segunda parte)”… Para publicar num futuro próximo! Talvez mesmo antes da explosão de Betelgeuse…!

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Toda a lógica da questão

Regressemos às curiosidades da Matemática. Curiosidades que, por serem tão peculiares, vão entrar em colapso com a nossa forma de ver as coisas. O que responder quando alguém nos diz que “todos os elefantes são vermelhos”? Ou que “todos os pianos têm apenas 12 teclas”? Ou ainda que “todos os pinguins vivem no Pólo Norte”? Mais: “todos os diamantes são «duproquebradiços»”? Confesso que não foi fácil encontrar uma palavra foneticamente agradável que não constasse no dicionário português… Claro que podemos sempre pensar que a pessoa que afirma tais coisas não joga com os dados todos. Contudo há que responder com o mesmo nível de raciocínio e, provavelmente, isso vai requerer um certo requinte na nossa resposta… Se calhar, as ideias absurdas que às vezes nos são transmitidas (pensamos nós que são absurdas!) são, na realidade, verdadeiras obras de arte no complexo mecanismo que dita as leis do raciocínio. Bem! Em primeiro lugar, o leitor poderá questionar a relação entre as últimas sentenças e a Matemática. A realidade é que a Matemática ocupa-se precisamente destas coisas: o estudo do raciocínio. E também do estudo do estudo do raciocínio. E ainda do estudo do estudo do estudo do raciocínio… A cadeia é infindável e apenas as mentes mais brilhantes conseguem atingir o terceiro nível. Neste momento a minha mente fervilha de curiosidades para escrever e a minha vontade é colocá-las imediatamente aqui, neste blog, sem mais perdas de tempo. Mas tenho que ir com calma e explicar umas coisas primeiro… Talvez os computadores sejam «ambipalpotentes» e, um dia, tal seja possível…!
O último parágrafo revela a ocupação da maior parte dos filósofos de hoje em dia. Mesmo na linguagem do quotidiano é necessário criar um sistema coerente onde as afirmações façam sempre sentido, ou não, independentemente da interpretação da mesma (desde que, claro está, tal interpretação esteja inserida no mesmo sistema). Esse sistema baseia-se na lógica matemática. Na realidade uma gramática de português é um manual maravilhoso de matemática. Não acredita? Vejamos:
RACIOCÍNIO E METALINGUAGEM
Os alicerces do nosso conhecimento.
Hoje em dia os filósofos debatem acerca de todos os tipos de raciocínio que a nossa massa cinzenta é capaz de produzir. A meu ver, e no espírito de cientista, existem dois grandes tipos de raciocínio nos quais se incluem, directa ou indirectamente, todos os outros: A Dedução e a Indução. Decerto que, se estudou filosofia no ensino secundário, recorda-se destes termos. Mas para debater as ideias da Dedução e da Indução, é necessário primeiro abordar alguns pilares da Lógica de Primeira Ordem, assim chamada numa tentativa de mecanizar, como uma grande linha de montagem, o nosso pensamento: desde a matéria prima à caixa de sapatos…
No caso do pensamento lógico, as matérias primas são os chamados termos e conceitos. Termos são os nomes pelos quais chamamos as coisas. Por exemplo “bola de futebol”, “rio Tejo” ou “avestruz”. Os conceitos são os significados que lhes estão associados:
Bola de Futebol – superfície esférica, normalmente feita de couro, oca, cujo diâmetro mede aproximadamente 22 centímetros; o seu peso deve variar entre 410 e 450 gramas e a sua pressão no interior deve medir entre 0,6 e 1,1 atmosferas (aproximadamente entre 60,8 e 111,5 kPa) a zero metros de altitude.
Rio Tejo – curso de água mais extenso da Península Ibérica (cerca de 1007 km de extensão); a sua nascente situa-se em Espanha na Serra de Albarracín (a pouco mais de 1500 metros de altitude); desagua em Portugal na cidade de Lisboa.
Avestruz – (Struthio camelus) espécie animal pertencente à classe das aves originárias do continente africano; apesar de ser uma ave não voa; considerada por muitos a maior ave existente no planeta na actualidade; podem atingir os 150 kg de peso e os 2,5 metros de altura.
Para tornar a última noção mais “matemática” podemos pensar em conceitos como: “dois”, “multiplicação” ou “conjunto”. Termos e conceitos, por si só, não podem ser classificados como verdadeiros ou falsos. O que fazemos a seguir é combiná-los de modo a obter afirmações cujo valor lógico já pode ser determinado. Tal processo é exactamente o alicerce tanto da linguagem corrente (no nosso caso, o português), como da linguagem matemática. Essas afirmações, ou proposições, são sempre verdadeiras ou falsas, mesmo que não conheçamos a resposta, não existindo uma terceira opção para a sua classificação.
• PROPOSIÇÕES VERDADEIRAS:
«As bolas de futebol são redondas»    ou    « 1 + 0 = 1 »
• PROPOSIÇÕES FALSAS:
«O rio Tejo nasce na Serra da Estrela»    ou    «Um triângulo pode ter dois ângulos internos rectos»
• PROPOSIÇÕES COM VALOR LÓGICO DESCONHECIDO:
«As avestruzes vão extinguir-se em 2013»    ou    «Existem números perfeitos ímpares»
A última proposição diz respeito a uma conhecidíssima questão matemática ainda por resolver (talvez num futuro próximo). Claro que, o nosso senso comum, diz-nos que é pouco provável que as avestruzes se extingam daqui a dois anos. O que está em causa, no entanto, não é a capacidade de garantirmos a veracidade ou a falsidade da questão. A única coisa que podemos garantir é que a proposição é verdadeira (esperemos que não em prol do bem-estar das avestruzes) ou falsa e não existe uma terceira possibilidade.
As proposições apresentadas inserem-se no primeiro nível da nossa linguagem: a primeira metalinguagem ou metalinguagem de primeira ordem. Qualquer pessoa saudável consegue atingir este nível de metalinguagem. Mas quando classificamos os mecanismos da primeira metalinguagem, subimos um degrau numa escala de complexidade exponencialmente crescente: a segunda metalinguagem ou metalinguagem de segunda ordem. É neste nível que algumas coisas interessantes acontecem. É também nesta fase que entram os dois tipos principais de raciocínio: a Dedução, que assenta numa série de regras de inferência de modo a concluir a veracidade ou falsidade de algo e a Indução que objectiva a mesma conclusão baseando-se, contudo, em inúmeras observações.
Pode-se, por exemplo, concluir que a proposição «O rio Tejo nasce na Serra da Estrela» é falsa por dedução. Como se viu, no conceito de “rio Tejo”, este nasce na Serra de Albarracín. Logo não pode nascer na Serra da Estrela e, portanto, a proposição é falsa. Já a proposição «As bolas de futebol são redondas» é verdadeira por indução. Alguma vez viu uma bola de futebol que não fosse redonda??? Os inúmeros exemplos que já presenciámos nas nossas vidas e as inúmeras bolas de futebol que já vimos, permite-nos afirmar confortavelmente que todas as bolas de futebol são assim.
O MECANISMO DA DEDUÇÃO
Regras para que te quero…
Para compreender este tópico vejo-me obrigado a apelar à sua capacidade de concentração. O que vamos avaliar aqui é a veracidade dos vários mecanismos dedutivos que utilizamos para tirar conclusões verdadeiras. Apimento-lhe desde já a curiosidade com a frase «Se as bolas de futebol são cúbicas então o rio Tejo nasce na Serra da Estrela» que, garanto-lhe ser INDUBITAVELMENTE verdadeira! Será o primeiro parágrafo deste blog inteiramente dedicado à metalinguagem de segunda ordem. O leitor está pronto para começar?
Começamos com as três regras básicas da inferência: a conjunção, a disjunção e a negação. A conjunção e a disjunção tratam da veracidade ou falsidade da relação entre duas proposições de metalinguagem de primeira ordem. A conjunção utiliza normalmente a palavra “e” enquanto que a disjunção utiliza a palavra “ou”. A negação é uma regra aplicável a apenas uma proposição metalinguística de primeira ordem e recorre à palavra “não” para se exprimir no nosso dia-a-dia.
AS CONJUNÇÕES
Frases como:
As galinhas são aves e os gatos são mamíferos,
As galinhas são aves e os gatos são anfíbios,
As galinhas são répteis e os gatos são mamíferos ou
As galinhas são répteis e os gatos são anfíbios
são exemplos de conjunções. Identificamo-las pelo elemento “e” que liga, em todos os quatro casos, as duas proposições de metalinguagem de primeira ordem. Das quatro frases anteriores apenas uma é verdadeira. Consegue identificá-la? É natural que sim. A primeira proposição «As galinhas são aves e os gatos são mamíferos» é a única verdadeira de entre as quatro. Portanto uma conjunção é verdadeira se as duas proposições envolvidas forem simultaneamente verdadeiras.
Para esquematizar este tipo de raciocínio, os filósofos e matemáticos de outrora desenvolveram uma técnica fácil e infalível: as tabelas de verdade. Para tal representamos as duas proposições envolvidas por duas letras, normalmente p e q. O que fazemos a seguir é indicar o valor lógico da conjugação entre p e q (que se representa por p Λ q) em função dos vários valores lógicos possíveis para p e q. Utilizam-se as letras V e F para indicar se as várias proposições são verdadeiras ou falsas respectivamente.
CONJUNÇÃO
p
q
p Λ q
V
V
V
V
F
F
F
V
F
F
F
F
Tenha em conta que «A Terra é um planeta» e que « 5⁸ = 390 625 » são proposições verdadeiras em metalinguagem de primeira ordem. Consegue indicar se as conjunções seguintes são verdadeiras? Experimente:

ALGUMAS CONJUNÇÕES
 proposições
valor lógico
resposta
 A Terra é um planeta e 5⁸ = 10
 A Terra é um planeta e 5⁸ = 390 625
 A Terra é uma estrela e 5⁸ = 390 625
 A Terra é um cometa e 5⁸ = 390 625
AS DISJUNÇÕES
Dado o significado da palavra “ou” atribuído pela maior parte das pessoas a veracidade das disjunções é um pouco mais difícil de avaliar. Retomemos os exemplos das classes das galinhas e dos gatos:
As galinhas são aves ou os gatos são mamíferos,
As galinhas são aves ou os gatos são anfíbios,
As galinhas são répteis ou os gatos são mamíferos ou
As galinhas são répteis ou os gatos são anfíbios
Das últimas quatro disjunções, apenas uma é falsa. A primeira não oferece dificuldades de maior uma vez que tanto a proposição «As galinhas são aves» como a proposição «Os gatos são mamíferos» são verdadeiras. As duas disjunções seguintes contêm uma proposição verdadeira e uma proposição falsa. A partícula “ou” permite garantir a veracidade da disjunção se, pelo menos, uma das afirmações for verdadeira. Assim, uma disjunção é falsa apenas se todas as proposições nela envolvidas forem falsas.
Se representarmos uma disjunção por p V q , a sua tabela de verdade tem o aspecto seguinte:
DISJUNÇÃO
p
q
p V q
V
V
V
V
F
V
F
V
V
F
F
F
Utilize os exemplos do ponto anterior para verificar se as seguintes afirmações são verdadeiras ou falsas. Não se precipite e responda com calma.

ALGUMAS DISJUNÇÕES
 proposições
valor lógico
resposta
 A Terra é um planeta ou 5⁸ = 10
 A Terra é um planeta ou 5⁸ = 390 625
 A Terra é uma estrela ou 5⁸ = 390 625
 A Terra é um cometa ou 5⁸ = 10
AS NEGAÇÕES
Tal como nos diz a intuição linguística, a negação de uma proposição muda-lhe o valor lógico, isto é, a negação de uma proposição verdadeira é uma proposição falsa e vice-versa. São exemplos de negações:
As galinhas não são aves,
Os gatos não são mamíferos,
As galinhas não são répteis ou
Os gatos não são anfíbios
A partícula linguística nas negações é, evidentemente, a palavra “não”. Das últimas quatro proposições é fácil constatar que as primeiras duas são falsas enquanto que as últimas duas são verdadeiras.
Se representarmos uma negação por ¬p , a sua tabela de verdade toma a forma:
NEGAÇÃO
p
¬p
V
F
F
V
Ainda em relação aos exemplos dos últimos exercícios, indique o valor lógico das seguintes negações:

ALGUMAS NEGAÇÕES
 proposições
valor lógico
resposta
 A Terra não é um planeta
 5⁸ ≠ 10
 5⁸ ≠ 390 625
 A Terra não é um cometa
Façamos, para já, uma pausa no prosseguimento das regras de inferência dedutiva, pois é nesta fase que começam a surgir os problemas…! Na realidade, todas as regras que se seguem podem ser decompostas em conjunções, disjunções e negações. Estas três são, na verdade, os alicerces do nosso raciocínio dedutivo. Mas os paradoxos que lhes são adjacentes tornam a vida dos filósofos de hoje em dia numa autêntica montanha russa de pensamentos.
Tudo acontece quando as proposições metalinguísticas de primeira ordem incidem sobre o seu próprio valor lógico ou sobre a sua própria estrutura. Por exemplo as proposições «Esta frase tem cinco palavras» e «As galinhas são aves» contradizem um pormenor que julgávamos ser coerentemente verdadeiro. Repare que ambas as proposições são verdadeiras. No entanto, as sua conjunção «Esta frase tem cinco palavras e as galinhas são aves» é evidentemente uma proposição falsa, uma vez que esta nova proposição constitui uma frase com mais de cinco palavras. Ao que tudo indica, este exemplo parece sugerir que, em certos casos, se tem:
CONJUNÇÃO??
p
q
p Λ q
V
V
F

No exemplo, inspirado no anterior, as proposições «Esta frase tem dez palavras» e «As galinhas são répteis» lidamos com duas proposições falsas. A sua disjunção «Esta frase tem dez palavras ou as galinhas são répteis» é uma proposição verdadeira. Parece então que encontrámos um exemplo onde:
DISJUNÇÃO??
p
q
p V q
F
F
V

Mesmo na negação, com um pouco de dedicação, vamos encontrar casos estranhos. A proposição «Esta frase tem seis palavras» é evidentemente falsa. A sua negação «Esta frase não tem seis palavras» é, como é evidente, falsa também. E agora? Até a negação, aquela regra de inferência com que lidamos desde muito cedo, apresenta falhas? Parece que encontrámos um caso onde:
NEGAÇÃO??
p
¬p
F
F
Não se deixe iludir pelos últimos exemplos. As frases que utilizei são inconcebíveis e não devem ser formuladas num discurso coerente. Mesmo esta última frase que escrevi é uma frase inconcebível uma vez que as frases exemplificadas não devem ser chamadas de “frases”. E a última frase é também inconcebível pois denomina por “frase” uma coisa que não o é.
Se pretender, pode elevar o grau da metalinguagem referindo indefinidamente a recorrência utilizada no parágrafo anterior. Se conseguir prosseguir, então parabéns…  O leitor é um génio…!
Para resolver este tipo de questões, o famoso matemático e filósofo britânico Bertrand Russel (1872 – 1970) desenvolveu a famosa Teoria dos Tipos. Trata-se de, no fundo, uma teoria matemática de Conjuntos mas perfeitamente aplicável à teoria das Proposições. Para Russel, as proposições devem ser colocadas numa hierarquia de valores lógicos. Assim, uma proposição nunca se deve referir a si própria, nem quanto ao seu valor lógico nem quanto à sua estrutura. Os conjuntos de palavras que exemplifiquei anteriormente (atrever-me-ei a chamar-lhes de frases e recomeçar aquele ciclo vicioso???) pura e simplesmente não são frases. Portanto se alguém lhe disser «Esta frase tem cinco palavras» pode responder com «Isso, para começar, nem sequer é uma frase» elevando a metalinguagem elegantemente dizendo em seguida «E a última frase que disse tem oito palavras». Se pretender ser ainda mais elegante, prossiga com «E a última frase que disse tem vinte palavras» concluindo coerentemente com uma metalinguagem ainda superior «A minha última frase é falsa».
Claro que há mais partículas que ligam duas (ou mais) proposições, entre as quais as implicações (partícula: “então”), os condicionais (partícula: “se”), as equivalências (partícula: “se e apenas se”) e as disjunções exclusivas (partícula: “Ou... ou”). Todas estas, no entanto, podem decompor-se em conjunções, disjunções e negações. Para perceber como funcionam, temos as seguintes tabelas de verdade:
IMPLICAÇÃO
CONDICIONAL
EQUIVALÊNCIA
OU EXCLUSIVO
p
q
p =>  q p <=  q p <=>  q p V q
V
V
V
V
V
F
V
F
F
V
F
V
F
V
V
F
F
V
F
F
V
V
V
F

No campo das implicações encontramos alguns exemplos à primeira vista absurdos. Regressemos às classificações taxionómicas das galinhas e dos gatos:
Se as galinhas são aves então os gatos são mamíferos,
Se as galinhas são aves então os gatos são anfíbios,
Se as galinhas são répteis então os gatos são mamíferos ou
Se as galinhas são répteis então os gatos são anfíbios
Note que, de entre estes exemplos, apenas um diz respeito a uma proposição falsa: «Se as galinhas são aves então os gatos são anfíbios». As restantes são verdadeiras. É também neste parágrafo que relembro a proposição «Se as bolas de futebol são cúbicas então o rio Tejo nasce na Serra da Estrela» que garanti no início deste tópico ser verdadeira (consegue perceber porquê?!). Bem…! Na realidade, explicar o porquê de tal acontecer não é fácil. Mas vou tentar… Certamente que não é complicado analisar as duas primeiras proposições que começam com «Se as galinhas são aves então…». Naturalmente que «As galinhas são aves» é uma proposição verdadeira. Se uma implicação começa com uma proposição verdadeira o seu valor lógico final dependerá apenas do valor lógico da proposição implicada. Daí a proposição ser verdadeira se terminar com «…os gatos são mamíferos» e falsa se terminar com «…os gatos são anfíbios». Mesmo a última proposição «Se as galinhas são répteis então os gatos são anfíbios» não oferece dificuldades de maior. Ora se, realmente, nem as galinhas são répteis nem os gatos são anfíbios, é de esperar que o facto da falsidade da primeira proposição implicar a falsidade da segunda, seja, de facto, um facto verdadeiro…!!!
O problema reside na terceira linha da respectiva tabela de verdade ou na terceira proposição apresentada «Se as galinhas são répteis então os gatos são mamíferos». No entanto, tal como na última proposição exemplificada, quando a proposição antecedente é falsa o resultado é sempre verdadeiro, independentemente do valor lógico da proposição consequente. Isto porque não é usual utilizar implicações quando se sabe que, à priori, que a proposição antecedente é falsa. Contudo, a conclusão EM SI, e não as proposições individuais, é verdadeira em ambos os casos.
Nos condicionais deparamo-nos com implicações em “sentido contrário”. As justificações são, em geral, idênticas ao caso anterior. Basta concluir que, por exemplo, dizer que «Se as galinhas são aves então os gatos são mamíferos» é o mesmo que dizer que «Os gatos são mamíferos se as galinhas são aves». As quatro frases seguintes ditam as implicações em sentido contrário das anteriores:
As galinhas são aves se os gatos são mamíferos,
As galinhas são aves se os gatos são anfíbios,
As galinhas são répteis se os gatos são mamíferos ou
As galinhas são répteis se os gatos são anfíbios
As equivalências, ou implicações em sentido duplo, são verdadeiras nos casos em que ambas as proposições têm o mesmo valor lógico e falsas caso contrário.
As galinhas são aves se e só se os gatos são mamíferos,
As galinhas são aves se e só se os gatos são anfíbios,
As galinhas são répteis se e só se os gatos são mamíferos ou
As galinhas são répteis se e só se os gatos são anfíbios
Destas equivalências, a primeira e a última são verdadeiras porque, em ambos os casos, conjugámos proposições simultaneamente verdadeiras (primeira proposição) ou simultaneamente falsas (última proposição). As restantes são proposições falsas pois envolvem proposições com valores lógicos diferentes.
Finalmente, relativamente à disjunção exclusiva, temos proposições verdadeiras apenas quando lidamos com uma proposição verdadeira e uma proposição falsa. De uma forma muito grosseira trata-se da situação contrária à equivalência.
Ou as galinhas são aves ou os gatos são mamíferos,
Ou as galinhas são aves ou os gatos são anfíbios,
Ou as galinhas são répteis ou os gatos são mamíferos ou
Ou as galinhas são répteis ou os gatos são anfíbios
Relembre que «A Terra é um planeta» e « 5⁸ = 390 625 » são proposições verdadeiras e verifique se consegue determinar a veracidade das seguintes proposições:

ALGUMAS PROPOSIÇÕES
 proposições
valor lógico
resposta
 Se a Terra é um planeta então 5⁸ ≠ 390 625
 A Terra é um planeta se 5⁸ = 390 625
 A Terra é um cometa se 5⁸ = 390 625
 A Terra é um cometa se 5⁸ ≠ 10
 Se a Terra é um cometa então 5⁸ = 390 625
 Se a Terra é um cometa então 5⁸ ≠ 390 625
 A Terra é um cometa se e só se 5⁸ = 10
 A Terra é um cometa se e só se 5⁸ ≠ 10
 A Terra é um planeta se e só se 5⁸ = 390 625
 Ou a Terra é um planeta ou 5⁸ = 390 625
 Ou a Terra é um cometa ou 5⁸ = 390 625
 Ou a Terra é um cometa ou 5⁸ ≠ 10
A TERCEIRA ORDEM DA METALINGUAGEM
O degrau seguinte.
Vamos agora um pouco mais longe (ainda???) e analisar as várias relações existentes entre as regras de inferência utilizadas no último tópico. É nesta fase que vamos encontrar as tautologias e as contradições, proposições de terceira metalinguagem verdadeiras ou falsas, respectivamente. Uma tautologia define-se então como uma proposição verdadeira independentemente do valor lógico das proposições de primeira metalinguagem nelas envolvidas. Nas mesmas condições, uma contradição é sempre uma proposição falsa. É nesta fase que vamos encontrar várias formas equivalentes de afirmar o mesmo. Depois da análise da equivalência, se encontrarmos uma tautologia então estamos perante um novo teorema, uma nova lei, uma nova conclusão viável. Uma vez que a negação de uma tautologia é uma contradição, e vice-versa, o cenário é idêntico caso nos deparemos com conclusões sempre falsas.
• COMUTATIVIDADE
Daqui agora resulta novo conjunto de regras e frases ainda mais estranhas. Uma das regras mais simples é a comutatividade. Esta aplica-se tanto às conjunções como às disjunções e limita-se a afirmar que, tanto uma como outra, não altera o seu valor lógico quando trocamos as proposições entre si.
As galinhas são aves e os gatos são mamíferos se e só se os gatos são mamíferos e as galinhas são aves,
As galinhas são aves e os gatos são anfíbios se e só se os gatos são anfíbios e as galinhas são aves,
As galinhas são répteis e os gatos são mamíferos se e só se os gatos são mamíferos e as galinhas são répteis ou
As galinhas são répteis e os gatos são anfíbios se e só se os gatos são anfíbios e as galinhas são répteis
Todas as proposições anteriores são verdadeiras (consegue perceber porquê?). Agora, no novo degrau metalinguístico, não é a classe das galinhas nem a classe dos gatos que interessam ao valor lógico de toda a proposição. O que interessa à terceira metalinguagem é se o valor lógico da proposição antecedente «As galinhas são… e os gatos são…» é, ou não, igual ao valor lógico da proposições consequente «Os gatos são… e as galinhas são…» sejam elas verdadeiras ou falsas. No que diz respeito às disjunções a regra é similar:
As galinhas são aves ou os gatos são mamíferos se e só se os gatos são mamíferos ou  as galinhas são aves,
As galinhas são aves ou  os gatos são anfíbios se e só se os gatos são anfíbios ou  as galinhas são aves,
As galinhas são répteis ou  os gatos são mamíferos se e só se os gatos são mamíferos ou  as galinhas são répteis ou
As galinhas são répteis ou  os gatos são anfíbios se e só se os gatos são anfíbios ou  as galinhas são répteis
As tabelas de verdade ficam com a forma:
COMUTATIVIDADE DA CONJUNÇÃO
p
q
p Λ q
q Λ p
(p Λ q)<=> (q Λ p)
V
V
V
V
V
V
F
F
F
V
F
V
F
F
V
F
F
F
F
V

COMUTATIVIDADE DA DISJUNÇÃO
p
q
p V q
q V p
(p V q)<=> (q V p)
V
V
V
V
V
V
F
V
V
V
F
V
V
V
V
F
F
F
F
V

Note que, na última coluna de ambas as tabelas apenas surgem V’s, o que significa que estamos perante tautologias. Entre outros exemplos temos ainda as propriedades (explícitas de uma forma resumida):
• IDEMPOTÊNCIA
As galinhas são aves se e só se as galinhas são aves e as galinhas são aves ou
As galinhas são répteis se e só se as galinhas são répteis e as galinhas são répteis
IDEMPOTÊNCIA DA CONJUNÇÃO
p
p Λ p
p <=> (p Λ p)
V
V
V
F
F
V

As galinhas são aves se e só se as galinhas são aves ou as galinhas são aves ou
As galinhas são répteis se e só se as galinhas são répteis ou as galinhas são répteis
IDEMPOTÊNCIA DA DISJUNÇÃO
p
p V p
p <=> (p V p)
V
V
V
F
F
V

• DUPLA NEGAÇÃO
As galinhas são aves se e só se for mentira que as galinhas não são aves ou
As galinhas são répteis se e só se for mentira que as galinhas não são répteis
DUPLA NEGAÇÃO
p
¬p
¬(¬p)
p <=> [¬(¬p)]
V
F
V
V
F
V
F
V
• ASSOCIATIVIDADE
As galinhas e os gatos são, respectivamente, aves e mamíferos e os gafanhotos são insectos se e só se as galinhas são aves e os gatos e os gafanhotos são, respectivamente, mamíferos e insectos,
As galinhas e os gatos são, respectivamente, aves e mamíferos e os gafanhotos são peixes se e só se as galinhas são aves e os gatos e os gafanhotos são, respectivamente, mamíferos e peixes,
As galinhas e os gatos são, respectivamente, aves e anfíbios e os gafanhotos são insectos se e só se as galinhas são aves e os gatos e os gafanhotos são, respectivamente, anfíbios e insectos,
As galinhas e os gatos são, respectivamente, aves e anfíbios e os gafanhotos são peixes se e só se as galinhas são aves e os gatos e os gafanhotos são, respectivamente, anfíbios e peixes,...
ASSOCIATIVIDADE DA CONJUNÇÃO
p
q
r
p Λ q
(p Λ q) Λ r
q Λ r
p Λ (q Λ r)
[(p Λ q) Λ r]  <=> [p Λ (q Λ r)]
V
V
V
V
V
V
V
V
V
V
F
V
F
F
F
V
V
F
V
F
F
F
F
V
V
F
F
F
F
F
F
V
F
V
V
F
F
V
F
V
F
V
F
F
F
F
F
V
F
F
V
F
F
F
F
V
F
F
F
F
F
F
F
V

As galinhas ou os gatos são, respectivamente, répteis e mamíferos ou os gafanhotos são insectos se e só se as galinhas são répteis ou os gatos ou os gafanhotos são, respectivamente, mamíferos e insectos,
As galinhas ou os gatos são, respectivamente, répteis e mamíferos ou os gafanhotos são peixes se e só se as galinhas são répteis ou os gatos ou os gafanhotos são, respectivamente, mamíferos e peixes,
As galinhas ou os gatos são, respectivamente, répteis e anfíbios ou os gafanhotos são insectos se e só se as galinhas são répteis ou os gatos ou os gafanhotos são, respectivamente, anfíbios e insectos,
As galinhas ou os gatos são, respectivamente, répteis e anfíbios ou os gafanhotos são peixes se e só se as galinhas são répteis ou os gatos ou os gafanhotos são, respectivamente, anfíbios e peixes,...
ASSOCIATIVIDADE DA DISJUNÇÃO
p
q
r
p V q
(p V q) V r
q V r
p V (q V r)
[(p V q) V r]  <=> [p V (q V r)]
V
V
V
V
V
V
V
V
V
V
F
V
V
V
V
V
V
F
V
V
V
V
V
V
V
F
F
V
V
F
V
V
F
V
V
V
V
V
V
V
F
V
F
V
V
V
V
V
F
F
V
F
V
V
V
V
F
F
F
F
F
F
F
V

Poderia prosseguir com inúmeras regras e tautologias, mas isso tornar-se-ia demasiado exaustivo. Assim, com o intuito de prosseguir ao encontro da introdução deste post, apresentarei apenas mais uma inferência: a contra-recíproca:
• CONTRA-RECIPROCIDADE
A tautologia que diz respeito à proposição contra-recíproca é, sem dúvida, uma das mais utilizadas regras na obtenção de demonstrações em matemática. Para quem não sabe, uma demonstração é uma prova de um teorema ou, mais geralmente, de uma proposição verdadeira. Utiliza o facto da implicação num certo sentido ser logicamente equivalente à implicação no sentido contrário das negações das proposições iniciais. Utilizemos uma implicação simples da forma «Todos os gatos miam». Claro que se trata de uma implicação uma vez que é uma frase verbalmente simplificada de «Se uma coisa é um gato então essa coisa mia». A proposição contra-recíproca desta é a frase Se uma coisa não mia então essa coisa não é gato» ou, de uma forma mais simples «Se não mia, não é gato». A tabela de verdade que justifica esta tautologia é:
CONTRA-RECIPROCIDADE
p
q
p =>  q
¬q => ¬p
(p =>  q)<=> (¬q => ¬p)
V
V
V
V
V
V
F
F
F
V
F
V
V
V
V
F
F
V
V
V
Voltemos aos gatos e às galinhas:
As galinhas são aves implica que os gatos são mamíferos se e só se os gatos não são mamíferos implica que as galinhas não são aves,
As galinhas são aves implica que os gatos são anfíbios se e só se os gatos não são anfíbios implica que as galinhas não são aves,
As galinhas são répteis implica que os gatos são mamíferos se e só se os gatos não são mamíferos implica que as galinhas não são répteis ou
As galinhas são répteis implica que os gatos são anfíbios se e só se os gatos não são anfíbios implica que as galinhas não são répteis
É nesta altura que o leitor tem a legitimidade de escrever um novo destino na sua barra de endereços. Eu compreendo! Contudo, para os mais resistentes, garanto que a coisa vai melhorar... Na realidade, se desistir agora, vai perder conclusões interessantíssimas. Claro que poderia dizer que vai ter a oportunidade de ler tais conclusões se prosseguir a sua leitura... Mas a contra-recíproca parece-me mais persuasiva, não acha?
A veracidade de uma regra de inferência em metalinguagem de terceira ordem pode conduzir-nos a questões surpreendentemente falaciosas quando as tratamos no campo do raciocínio indutivo. Se não, vejamos:
A INDUÇÃO CONTRA-RECÍPROCA
Porque é que os elefantes são vermelhos?!
Ora, se bem se lembra, a veracidade de uma proposição justifica-se, por indução, pela quantidade enorme de exemplos que observamos no nosso dia-a-dia. Relembro-lhe que admite-se que «As bolas de futebol são redondas» é uma proposição verdadeira porque nunca se viu uma bola de futebol que não fosse redonda. Da mesma forma poder-se-á concluir que «Os elefantes são cinzentos», «Os pianos têm 88 teclas» e «Os pinguins vivem no Pólo Sul» são proposições verdadeiras.
Note agora que, se assistir a um jogo de futebol esta noite, vai, quase de certeza, ver pela primeira vez na sua vida aquela bola em jogo. Trata-se de mais um exemplo que reforça a ideia de «As bolas de futebol são redondas» ser uma proposição verdadeira. Isto significa que, à medida que se fabricam cada vez mais bolas de futebol, cada vez mais se verifica a veracidade da proposição.
Mas... E a contra-recíproca desta? Ora a frase «Coisas não redondas não são bolas de futebol» é equivalente à frase «As bolas de futebol são redondas». Então isso garante que, sempre que vê uma coisa não redonda, está, na realidade, a reforçar o facto das bolas de futebol serem redondas... Estranho? Vejamos: Uma tesoura não é redonda. Será uma bola de futebol? Evidentemente que não...
Desta forma, as coisas que não são cinzentas não são elefantes (uma nuvem branca não é um elefante), as coisas que não têm 88 teclas não são pianos (as calculadoras básicas não são pianos) e os animais que não vivem no Pólo Sul não são, evidentemente, pinguins (os pandas não vivem no Pólo Sul e não são pinguins). A nuvem, a calculadora básica e o panda reforçam então a veracidade das afirmações verdadeiras acerca dos elefantes, dos pianos e dos pinguins, respectivamente. Mas agora é que a porca vai torcer o rabo (tantos animais e ainda não tinha referido o porco...!!!).
Já vimos que a contra-recíproca da frase «As bolas de futebol são redondas» é a proposição «Coisas não redondas não são bolas de futebol». Independentemente do seu valor lógico, a contra-recíproca de «As bolas de futebol são cúbicas» é a proposição «Coisas não cúbicas não são bolas de futebol». Vimos também que uma tesoura não é redonda e, portanto, não pode ser uma bola de futebol. Mas também não é cúbica... E isso significa que a forma de uma tesoura tanto prova que «As bolas de futebol são redondas» como «As bolas de futebol são cúbicas». Como pode uma certa proposição provar indutivamente duas coisas tão incompatíveis? Além, claro está, provar indutivamente uma proposição evidentemente falsa (espero que não esteja a pensar que estou a tentar demonstrar que as bolas de futebol são cúbicas...!).
Desta forma, todas as nuvens que observámos na nossa vida visam provar que «Os elefantes são vermelhos». Todas as máquinas de calcular que vemos nas lojas dos chineses reforçam a ideia de que «Os pianos têm apenas 12 teclas». E aqueles pandas giríssimos que aparecem no National Geographic? Dizem-nos que afinal os pinguins vivem no Pólo Norte??
Como resolver esta questão? Por esta ordem de ideias temos:
CONTRA-RECIPROCIDADE INDUTIVA
nuvens brancas
 provam que:
 ● os elefantes são vermelhos
 ● os leopardos são roxos
 ● os melros são cor-de-rosa
 ● os grilos são verdes
calculadoras básicas
 provam que:
 ● os pianos têm apenas 12 teclas
 ● os computadores têm infinitas teclas
 ● os telecomandos têm 2.327 teclas
 ● os telemóveis têm duas teclas e meia
pandas
 provam que:
 ● os pinguins vivem no Pólo Norte
 ● os coalas vivem no fundo do mar
 ● os chimpanzés vivem no Evereste
 ● os seres humanos vivem na Lua
Esta questão filosófica resolve-se, segundo o autor deste fantástico paradoxo Carl Gustav Hempel (1905 – 1997), pela dimensão pouco significativa dos objectos que não são cinzentos em relação aos elefantes. Digamos que um elefante cinzento tem mais peso na veracidade da proposição do que uma nuvem branca. Isto porque, no Universo, existem indiscutivelmente muitos mais objectos não cinzentos do que elefantes. Sendo assim, uma nuvem branca prova, de facto, que um elefante é cinzento. Fá-lo, no entanto, a uma escala infinitesimal.
Há contudo quem contra-argumente e defenda que, se realmente existem muitos mais objectos não cinzentos do que elefantes, na sua totalidade provam tanto, ou ainda mais, que os elefantes são cinzentos. Mas desta forma, a quantidade considerável de objectos não vermelhos que existe no Universo demonstra que os elefantes são, de facto, vermelhos...
Mesmo que tome o partido de Hempel e acredite que APENAS elefantes cinzentos PODEM PROVAR que os elefantes são cinzentos, prometo-lhe ainda uma última surpresa.
O VALOR LÓGICO DESCONHECIDO
A falha da indução.
Para quem o paradoxo de Hempel não passa de uma curiosidade e não deve ser levado a sério, há ainda um pormenor adjacente a todos os elefantes cinzentos que provam precisamente que os elefantes são cinzentos que lhe pode dar a volta à cabeça. Isso porque os incontáveis elefantes cinzentos que já foram observados podem também provar outras coisas...
Defina-se uma nova cor. Uma cor especial... Com propriedades especiais. Chamemos-lhe "cinzemelho". A este novo termo, vamos atribuir o conceito:
Cinzemelho (pl. cinzemelhos) – um objecto cinzemelho tem a capacidade de ser cinzento antes do ano de 2020 d.C. e vermelho depois dessa mesma data.
Tal como um edifício velho ou uma ponte deteriorada, o conceito básico de Raciocínio Indutivo está prestes a ruir. Neste momento é fácil de ver que as proposições «Os elefantes são cinzentos» e «Os elefantes são cinzemelhos» estão IGUALMENTE provadas. Tal significa que, se eu disser a alguém que os elefantes são cinzemelhos (depois de expor o conceito de cinzemelho), não pode haver quem diga que estou a ficar maluco pois, na verdade, todos os elefantes já observados são cinzemelhos.
Estas conclusões permite também afirmar que «Os diamantes são duproquebradiços» ou que «Os computadores são ambipalpotentes». Basta, para o efeito, definir convenientemente os termos:
Duproquebradiço (pl. duproquebradiços) – um objecto duproquebradiço tem a capacidade de ser duro na nossa galáxia e quebradiço na galáxia mais próxima, a galáxia de Andrómeda.
Ambipalpotente (pl. duproquebradiços) – um objecto ambipalpotente tem a capacidade de funcionar quando o tempo está parado.
Tenha em conta que, no campo da Dedução não existe absurdo algum (mas serão estas últimas proposições realmente absurdas?!). Para o Raciocínio Dedutivo estas afirmações detêm um valor lógico desconhecido, isto é, não se sabe se são verdadeiras ou falsas. Tenha em conta também, contudo, que «Os elefantes são cinzentos» é também uma proposição que não se sabe ser verdadeira ou falsa. Não se pode concluir nada acerca da cor dos elefantes a nível dedutivo uma vez que, evidentemente, poderá haver um elefante vermelho algures (ainda não visto por ninguém) que deite por terra a lei que assegurávamos ser correcta.
A maior parte das pessoas poderão pensar que este tipo de conclusões são tiradas por alguém com muito tempo livre. Esta "conversa fiada" não nos leva a lado algum e não constitui qualquer benefício à humanidade. No entanto, lamento desiludir essas pessoas. Os efeitos destas conclusões não afectam naturalmente o nosso dia-a-dia nem a nossa conversação natural. Mas são importantíssimas no desenvolvimento de um ambiente que seja coerente para o avanço das ciências. O conhecimento científico baseia-se na observação. Inúmeras experiências, no entanto, não podem concluir nada como certo. Se eu deixar cair uma maçã no chão vezes sem conta, não posso concluir, apenas a partir desse facto, que ela irá sempre cair. Indutivamente, claro que sei que isso irá sempre acontecer... Mas já vimos que indutivamente os elefantes são cinzemelhos, portanto... Resta-lhe a si fazer o seu juízo de valor e acreditar que a maçã vai cair no chão graças à Lei da Gravitação Universal de Newton, provada por dedução e não por indução.
Apesar de tudo, é bastante reconfortante saber que os seres humanos conseguem pensar numa metalinguagem de terceira ordem. Este estudo baseia-se no mecanismo do raciocínio. Raramente conseguimos elevar o nível metalinguístico e, felizmente, também não precisamos de fazê-lo com frequência... Sinceramente acho que é esta nossa capacidade que nos distingue dos outros animais: a capacidade de estruturar a nossa forma de pensar, de raciocinar acerca do raciocínio em si. Talvez a raça humana evolua para metalinguagens mais avançadas... Uma metalinguagem que termine com as falhas da dedução e da indução de uma vez por todas. Os filósofos lógicos de hoje em dia discutem a possibilidade de um novo sistema, em quarta metalinguagem, que nos garanta que os elefantes são, afinal de contas, cinzentos. Para tal, no entanto, é necessário criar novas regras de inferência que estudem a veracidade na conjugação de tautologias e de contradições (conjugações difíceis de imaginar pois têm que ser estruturalmente diferentes das inferências de segunda ordem). Passamos ao nível em que não interessa se o elefante é cinzento ou vermelho... Nem interessa a legitimidade da forma como concluímos a cor do elefante. Consegue imaginar esse cenário? Consegue visualizar o que vai interessar então? Neste novo sistema vai entrar tudo em colapso (ainda maior) e propriedades tão simples como a comutatividade e a idempotência vão deixar de ter valor. A meu ver, no entanto, a questão dos elefantes vermelhos, resolve-se com o seguinte postulado em quarta metalinguagem:
Incoerência transitiva – uma implicação (indutivamente concluída) não pode ser considerada se não for consistentemente transitiva (uma maçã vermelha não prova, efectivamente, que os elefantes são vermelhos; prova, no entanto, que as nuvens são brancas que, por sua vez, prova que os elefantes são vermelhos).
É necessário criar uma lei que não permita que os elefantes sejam vermelhos pois vai ser importante da demonstração dos elefantes não serem cinzemelhos.
Implicações inválidas de proposições com valor lógico desconhecido  – a observação de uma lei tem tanto peso na sua veracidade como a observação da sua contra-recíproca desde que consistentemente transitiva (um objecto excepto se for um elefante não cinzemelho prova que os elefantes são cinzemelhos; retirados os objectos cinzentos da indução dada a incoerência transitiva, restam-nos os objectos que sabemos não serem cinzemelhos).
Estas duas definições, criadas por mim especialmente para este post, resolvem toda a questão em volta da cor dos elefantes. Se compreendeu a sua implicação, então os meus parabéns... E bem-vindo à metalinguagem de quarta ordem...!