Benvindos ao meu blog. Só mais um para aumentar a comunidade do blogger.
Como o tempo livre é muito e porque adoro ser irónico, (pois afinal de contas o tempo até nem é muito,
mas se o dissesse já não estava a ser irónico e, como acabei por dizê-lo à mesma, acabo por ser irónico ao afirmar que não o era)
é apenas mais um novo projecto na minha vida. Espero que gostem...

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Némesis: Segunda Desmistificação

A imaginação é, talvez, o factor mais determinante no avanço científico. Actualmente o paradigma do conhecimento recorre a muitas teorias enviusadas para justificar o comportamento natural das coisas. Só depois de imaginadas é que se passa à acção da observação e experimentação para refutá-las ou comprová-las… Para quem as imaginou, nada há a perder, a não ser o tempo e os recursos financeiros gastos durante essa observação caso a teoria não se venha a comprovar. Mas, no caso contrário, esse “quem” verá o seu nome escrito para sempre na história da ciência no nosso planeta. Um exemplo perfeito deste paradigma é a teoria de Némesis, a estrela companheira do nosso Sol. Para quem nunca ouviu falar, Némesis, se existir, será uma estrela denominada por Anã Castanha e orbita o nosso Sol numa órbita extremamente longínqua e elíptica. Apesar de nunca ter sido observada, a existência de Némesis justifica um dos maiores mistérios da paleontologia.

O COMEÇO – Uma explicação credível por ser tão viável

Tudo começou na tentativa de justificar as grandes extinções do passado, nomeadamente, a extinção do final do Cretáceo conhecida, sobretudo, pela aniquilação dos dinossauros há 65 milhões de anos atrás. Pai e filho, Luís e Walter Alvarez, ambos professores na Universidade de Berkeley, propuseram então uma justificação para tais acontecimentos baseados em amostras de estratos do solo que continham uma fina camada de irídio precisamente na fronteira entre o final do Cretáceo e início do Terciário. Essas amostras foram recolhidas em vários locais sugerindo então o depósito de irídio no solo em toda a superfície do planeta. Ora o irídio, o elemento 77 da tabela periódica, é um metal de transição muito raro no nosso planeta mas abundante na constituição dos cometas. A conclusão, ainda que não se possa comprovar, é bastante convincente: um cometa colidiu com a Terra e originou a extinção dos dinossauros. Mas a mente humana nunca se deixa saciar por uma resposta… 
Ora se a queda de um cometa do planeta originou a extinção do final do Cretáceo, porque não justificar da mesma forma as outras grandes extinções do passado? Na realidade a extinção dos dinossauros não foi a maior extinção em massa ocorrida no nosso planeta. Há cerca de 250 milhões de anos uma enorme extinção em massa aniquilou mais de 90 % das espécies vivas (animais, vegetais, algas, bactérias e fungos). Julga-se tratar-se da maior extinção de todos os tempos, assinalando-se desta forma, o final do período Permiano e o início do Triássico. Mas existem ainda mais extinções sugeridas pela paleontologia no nosso planeta:


O que se retrata no quadro anterior é que as seis maiores extinções de que há indícios (à excepção da extinção do final do Ordoviciano) adequam-se a intervalos de 32,5 milhões de anos. Outros estudos sugerem períodos levemente mais curtos mas todos eles se enquadram nestas ordens de grandeza). Para encontrar o valor encontrado também retirei da regressão a extinção do final de Ordoviciano (que resultou num desfasamento de mais de 10 milhões de anos relativos à segunda grande extinção prevista pelo padrão) pois, de todas as extinções, é a mais passível de não ter sido causada pelo impacto de um cometa, mas sim por uma onda de raios gama que atingiu o nosso planeta provenientes de uma explosão estrelar. Mas a questão não é o valor do intervalo mas sim a existência ou não de um padrão regular: As extinções no nosso planeta tendem a repetir-se em intervalos de 32,5 milhões de anos (± 5 ma) ou em intervalos múltiplos deste.
A ser verdade, que feito da Natureza provocaria a regularidade de tais eventos?

AS LEIS DE KEPLER – O cenário mais regular da natureza

Apesar de, à primeira vista, o tópico que se segue não estar minimamente relacionado com as grandes extinções do passado e com as regularidades que nelas se verificam, vamos mais tarde perceber como estes dois assuntos podem estar interligados, infelizmente, de uma forma bastante aterradora. As Leis de Johannes Kepler (1571 – 1630), astrónomo alemão que as desenvolveu, são três simples postulados que descrevem as órbitas de translação de objectos no espaço, nos quais se enquadram a órbita do nosso planeta em torno do Sol, ou de todos os objectos do Sistema Solar ou até mesmo da Lua em torno do nosso planeta. São elas:

• PRIMEIRA LEI: Os planetas e demais objectos do sistema solar descrevem órbitas elípticas em torno do Sol, que se situa num dos focos da órbita

Para quem não sabe, uma elipse é um género de circunferência “achatada” definida pelos pontos cuja soma a dois pontos dados (focos da elipse) é constante e maior que a distância entre eles. Para quem tem algumas dificuldades em matemática, vai certamente encontrar dificuldades também em interpretar, à primeira, o que está escrito na frase anterior. Para melhor compreender o significado de elipse, o melhor é mesmo fazer um desenho.


Na figura (do lado esquerdo) temos, a azul, os ponto F¹ e F² que representam os focos da elipse. Se considerarmos então P¹, que pertence à elipse, vemos a verde os segmentos de recta que liga P¹ a ambos os focos. A soma dos comprimentos desses dois segmentos de recta é sempre a mesma, qualquer que seja a posição do ponto P¹ e é portanto igual à soma dos comprimentos dos segmentos laranja (para P²) e é também igual à soma dos comprimentos dos segmentos roxos (para P³). Por norma, quanto mais afastados estão os focos um do outro, mais alongada será a elipse. No caso da órbita da terra (e nos planetas em geral) as órbitas são quase circulares uma vez que os focos estão relativamente perto um do outro. Para a órbita terrestre, os focos estão afastados por uns meros cinco milhões de quilómetros!! Muito pouco, sobretudo se compararmos à distância média da Terra ao Sol: 150 milhões de quilómetros… O Sol ocupa a posição de um dos focos da órbita elíptica da terra (F¹ na figura – lado direito). O outro foco, F², não passa de um ponto no espaço. É por estes motivos que a Terra tem um ponto da sua órbita mais próximo do Sol denominado por periélio (distância da Terra ao Sol no periélio: 147,1 milhões de km) e outro mais afastado denominado por afélio (distância da Terra ao Sol no afélio: 152,1 milhões de km).

• SEGUNDA LEI: O segmento de recta que une um objecto ao sol descreve, em tempos iguais, secções com a mesma área

Para a generalidade, a consequência desta lei é mais fácil de entender do que a sua descrição. Mesmo assim vou tentar explicar. Basta, para isso, considerar na órbita da terra, duas secções elípticas com a mesma área.


Na imagem da esquerda temos duas secções, uma verde e outra azul, que têm a mesma área. Note-se que a distância percorrida pelo nosso planeta para descrever a secção a verde é maior do que distância para descrever a secção azul. A segunda Lei de Kepler afirma então que, uma vez que as secções têm a mesma área, os tempos que a terra demora a percorrer as duas distâncias é o mesmo, o que significa que a velocidade de translação da Terra não é a mesma em todos os pontos da sua órbita: perto de periélio a Terra desloca-se a uma velocidade superior àquela a que se desloca perto do afélio. Se tal não fosse, ao afastar-se do afélio, o nosso planeta não resistiria à força gravítica do Sol e acabaria por colidir com o nosso astro-rei. Por outro lado, ao afastar-se do periélio, a sua grande velocidade poderia ser suficiente para escapar à força gravítica do sol e afastar-se-ia deste para sempre (como se pode ver à direita na figura anterior).

• TERCEIRA LEI: Os quadrados dos períodos de translação dos objectos são proporcionais aos cubos dos eixos maiores das suas órbitas

O eixo maior na órbita do planeta Terra é a distância entre o periélio e o afélio. A regra é geral para os demais objectos do sistema solar (tendo em conta cada uma das suas respectivas órbitas, naturalmente). Para o caso do planeta Terra, essa distância é sensivelmente igual a 300 milhões de quilómetros. O seu período de translação é igual, como se sabe a aproximadamente 365 dias, isto é, um ano. Ora a razão (ou o quociente) entre (1 ano)² = 1 e (2 UA)³ = 8 é igual para todos os objectos do sistema solar. Essa razão, a que vamos chamar k, é igual a 0,125 ano²/UA³ aproximadamente. Vamos, neste post, utilizar a unidade ano² por UA³ para facilitar as conclusões.

Desta forma se descrevem assim os movimentos dos objectos em torno do Sol quer os conheçamos quer não!

O OBJECTO ESTRANHO – Com 32,5 milhões de anos desde a última vez que o vimos

Porque razão os objectos responsáveis pelas grandes extinções massivas do passado colapsam sobre a terra com semelhante regularidade? A pergunta continua desprovida de resposta. Mas, em 1985, os astrónomos Whitmire e Matese, sugeriram a existência de uma estrela companheira do nosso Sol com uma órbita extremamente elíptica que, ao aproximar-se do seu apogeu impulsionaria milhões de cometas em direcção ao Sol, alguns dos quais cairiam sobre o nosso planeta. A ideia não é assim tão descabida. Graças às Leis de Kepler podemos então encontrar as características de tal objecto, pelo menos no que diz respeito à sua trajectória em torno do Sol. Na terceira lei de Kepler, fazendo k = 0,125 ano²/UA³, ao substituirmos o período de translação por 32,5 milhões de anos vamos encontrar o valor aproximado de 3,22 anos-luz para o comprimento do eixo maior da órbita do objecto (outros resultados foram encontrados consequentes de outros valores para os períodos de translação de acordo com a regularidade obtida nas análises às extinções em massa). Para quem está familiarizado com as unidades astronómicas de distância sabe que 3,22 anos-luz é uma distância muito grande até mesmo em relação ao nosso Sistema Solar interior. Esse objecto nunca estaria mais perto do Sol do que qualquer um dos seus conhecidos planetas. Se tal acontecesse a sua velocidade de translação no periélio seria monstruosa (pela segunda lei de Kepler). Especialistas sugerem que a distância mínima ao Sol do hipotético objecto teria que ser sensivelmente igual a um ano-luz:


No esquema anterior encontra-se o nosso sol e o hipotético objecto (a castanho). Como referência encontra-se também a estrela mais próxima de nós, a Próxima Centauri, que fica apenas a 4,2 anos-luz de distância. O objecto fictício, pelo menos por enquanto, gira em torno do Sol numa zona chamada Nuvem de Oort, a região limiar do nosso sistema solar. Essa zona situa-se a um ano-luz de distância e prolonga-se até aos 3 anos-luz. Nela encontra-se biliões de objectos, sobretudo cometas que orbitam em torno do nosso sol, cada uma com a sua trajectória específica. Nenhum destes cometas cruza o nosso sistema solar interior (a zona dos planetas), a não ser… O objecto em questão que vagueia hipoteticamente pela Nuvem de Oort pode ser muito grande. Pode ser até 10 vezes maior que Júpiter, o maior planeta do nosso sistema solar (presumivelmente). Com estas dimensões quase não há dúvidas tratar-se de uma estrela. Um outro sol companheiro do nosso… Por não ter sido ainda detectada, se for uma estrela, ela será uma Anã Castanha. Se existir ela já terá um nome… Temível… O seu nome é Némesis, em tributo à deusa grega da vingança, filha da deusa da noite Nix e do titã Tétis.
Némesis é então a estrela Anã Castanha do nosso sol. Uma Anã Castanha, ou Estrela Falhada, é uma estrela idêntica em tudo às outras estrelas convencionais a não ser no tamanho. Por ser demasiado pequena, o seu campo gravitacional no seu núcleo não é forte o suficiente para iniciar o processo de fusão nuclear – a reacção que ocorre nas estrelas ditas “normais” e que lhes confere o seu brilho “glamoroso”. Por esses motivos, as Anãs Castanhas são estrelas muito débeis, muito pouco brilhantes e muito pequenas. São, portanto, muito difíceis de detectar. A ideia do nosso sol ter uma estrela companheira não é assim tão descabida. Na realidade a maior parte das estrelas que vemos no céu nocturno são sistemas múltiplos de estrelas (cerca de 2/3). O que, na realidade, é difícil é encontrar uma explicação para a órbita exageradamente elíptica de Némesis.
Na minha opinião, contudo, se Némesis existir, não será estrela alguma. Será antes um cometa ou um asteróide invulgarmente grande. Como decerto sabe, Plutão foi excluído como planeta e simplesmente classificado como objecto anormalmente grande da Cintura de Kuiper, um outra região do nosso sistema solar para lá de Neptuno mas, no entanto, cem vezes mais próxima de nós que a Nuvem de Oort. Este tipo de anormalidades não é assim tão residual quanto pensamos. Na realidade acontecem com mais frequência do que um modelo de universo organizado e direitinho nos dá a entende. Talvez até seja muito pouco prudente chamar-lhes de anormalidades… Némesis pode muito bem ser um asteróide de grandes dimensões. Um planeta até! E um planeta rochoso… No nosso sistema solar, os planetas interiores são rochosos (os de menores dimensões, entre os quais se encontra a Terra) ou gasosos (os de maiores dimensões). No entanto, todos os dias descobrem-se novos planetas noutros sistemas solares, alguns dos quais bastante grandes e rochosos… O nosso universo alberga todos os tipos de todas as coisas – para quem gosta de ser pertinente, os planetas descobertos nas órbitas de estrelas distantes denunciam a sua presença quando “passam” à frente da sua estrela mãe; apesar de estar mais perto, Némesis é mais difícil de detectar sem um fundo de contraste que acuse a sua presença. Mas até comprovarmos a sua existência, Némesis continuará a ser um objecto hipotético, quer seja uma Anã Castanha ou não!

O PODER DA ATRACÇÃO – Némesis dispara milhões de balas contra nós

Tal como o sol e a maior parte dos planetas do sistema solar (e até Plutão), muitos objectos do céu albergam outros objectos mais pequenos nas suas órbitas. Tal acontece devido à Força da Gravidade. Dois corpos, desde que possuam massa, atraem-se mutuamente. É esta simples lei que nos prende à superfície da Terra. A Lei da Gravidade está tão presente nas nossas vidas quotidianas que nem sequer damos por ela no dia-a-dia. Mas ela está lá… E é ela que rege todos estes movimentos. A lei que faz com que regressemos à terra depois de dar um salto, é a mesma que faz com que um corpo orbite em torno de outro. Pode facilmente criar uma pseudo-órbita com as suas próprias mãos. Basta, por exemplo, atirar um seixo a um riacho. Por alguns instantes o seixo orbita em torno da terra. No entanto a sua velocidade não é suficiente para resistir à atracção gravitacional do nosso planeta, pelo que acaba por cair. Para combater a força da gravidade e colocar um objecto em órbita é necessário viajar a uma velocidade superior a 11 quilómetros por segundo à superfície da terra. Esta é a velocidade que um objecto terá que alcançar para ser colocado em órbita (não é o caso dos foguetões que são propulsionados e podem deixar o campo gravitacional da terra desde que haja combustível suficiente para o efeito). Uma vez em órbita, um corpo está constantemente a “cair” sobre o outro. A Lua, por exemplo, “cai” sobre a Terra constantemente, mas, ao contrário do seixo que atiramos ao rio, não chega mesmo a colapsar sobre o nosso planeta pois a sua velocidade (que nunca diminui pois, no espaço, não existe atrito do ar) é suficiente para permanecer a 384.400 km da superfície da terra.
É esta mesma força que também é capaz de mudar a trajectória de um objecto. Um pequeno asteróide, se passar perto do nosso planeta, por exemplo, pode ver a sua trajectória alterada por acção gravitacional deste, como que, se por instantes, orbitasse o nosso planeta.


Em geral, quanto mais se aproximar o asteróide do nosso planeta, maior é a curvatura provocada pela gravidade na sua trajectória. Se se aproximar demasiado, então o asteróide acabará por colidir com a superfície terrestre. Ora, na Nuvem de Oort pode ocorrer algo similar com Némesis e milhões de cometas podem ser disparados na direcção do sol. Perto do seu Apogeu isso representaria um grande risco para o nosso planeta pois, ao contornar Némesis na direcção do centro do sistema solar, não haveriam mais obstáculos significativos até ao disco planetário.


De entre milhões de cometas influenciados pela acção gravitacional de Némesis na direcção do nosso sol, alguns, eventualmente de grandes dimensões, acabaria por colidir com a terra provocando grandes extinções em massa. E está, desta forma exposta uma das possíveis explicações para os intervalos aparentemente regulares das grandes extinções do passado no nosso planeta.

PARA TERMINAR…

A teoria da existência de Némesis tende a cair em descrédito, sobretudo por nunca se terem encontrado indícios da sua presença. A comunidade científica cada vez mais está consciente que, se Némesis existisse, então já teria sido detectada. Por outro lado, se realmente Némesis for um asteróide de grandes dimensões ou até mesmo um planeta, pode escapar-nos facilmente ao olho nocturno, por muito potente que seja o telescópio utilizado. Em todo o caso, por enquanto, Némesis não passa de um pensamento humano, quer enquanto estrela companheira do sol quer enquanto deusa da vingança. E, por isso mesmo, talvez devêssemos partir em busca de outros modelos que justifiquem a regularidade periódica das extinções massivas que ocorrem no nosso planeta. Apenas gostaria ainda de referir que, se prestou atenção ao primeiro gráfico deste post, decerto reparou na possível ocorrência de uma grande extinção no presente. Se leu o post anterior, certamente que será tentado a relacionar as duas conclusões. No entanto os dois temas nem sequer se devem comparar. O estudo feito no post anterior relacionou eventos dos últimos 680 000 anos. Por outro lado, neste post trataram-se períodos muito maiores, na ordem dos 600 milhões de anos. Caberiam quase mil períodos do post anterior no período considerado neste. Os dois temas são muito difíceis de conjugar, senão mesmo, absurdamente conjugáveis!