Benvindos ao meu blog. Só mais um para aumentar a comunidade do blogger.
Como o tempo livre é muito e porque adoro ser irónico, (pois afinal de contas o tempo até nem é muito,
mas se o dissesse já não estava a ser irónico e, como acabei por dizê-lo à mesma, acabo por ser irónico ao afirmar que não o era)
é apenas mais um novo projecto na minha vida. Espero que gostem...

domingo, 21 de fevereiro de 2010

Serial Singer

Eu adoro coisas aleatórias. Ainda que entre em conflito com a Teoria da Relatividade de Einstein em prol da Teoria Quântica, temos que admitir que, neste momento, a melhor explicação do modelo natural do cosmos assenta num compromisso entre as duas teorias. Mas deixemo-nos disso por agora. Falemos antes de Arte. Arte aleatória.
A música é a minha forma de Arte de eleição. No entanto, alguma música contemporânea ultrapassa o meu limite pessoal de elegibilidade. Muita dessa música resulta dos resquícios da mente humana, uma forma muito rebuscada de música. A meu ver, tudo começou a 29 de Agosto de 1952 quando o pianista David Tudor executou, na sala de concertos de Maverick em Nova Iorque, uma das peças mais notáveis da história da música: a obra 4’33’’ do compositor Jonh Cage. Para quem ainda não ouviu falar nesta obra, trata-se de uma peça silenciosa. O pianista senta-se em frente ao piano e, passados 4 minutos e 33 segundos levanta-se e abandona o palco sem tocar numa única tecla. Tal como Jonh Cage escrevera uma vez, «A minha composição preferida é aquela que estamos sempre a ouvir se guardarmos silêncio».
Depois dos 4’33’’, a música seguiu uma liberdade incompreendida, fluindo para todas as maneiras possíveis de escrever música. Foi também Jonh Cage que sugeriu a escrita de música aleatória (chegou mesmo a escrever música a partir do lançamento de dados). Começou assim a história da chamada música serial.

Hoje em dia é muito mais fácil escrever música serial pois temos computadores que simulam experiências aleatórias. Aliás, com um pouco de conhecimentos em programação, o computador pode converter depois a experiência aleatória numa partitura e pode até executá-la… Na minha opinião, hoje em dia, a música serial não passa de uma experiência trivial e a sua criação está ao alcance de qualquer um, com ou sem intuição musical.

Vejamos as minhas experiências que, basicamente, consistem em números aleatórios que representam notas musicais. Como gosto de tocar piano (não muito, sou apenas um entusiasta sem talento), criei duas linhas com números aleatórios cada uma das linhas correspondentes a uma pauta do piano, uma para a mão direita (em clave de sol, como é habitual) e outra para a mão esquerda (em clave de fá). Em ambas as linhas os números aleatórios variam entre 1 e 24 o correspondente a 24 meio tons, isto é, a duas escalas. Temos, portanto, um total de quatro escalas consecutivas na pauta tal como sugere a figura seguinte


Nas primeiras músicas aleatórias criadas pelo meu computador, considerei todas as notas com o mesmo tempo (um tempo musical ou semínimas). Aqui está a primeira música:




Os resultados podem ser variadíssimos. Outro exemplo prova isso mesmo:




Como não há duas sem três, cá está outra composição serial:




Apesar de não parecer, as três últimas composições, na realidade, são bastante diferentes. O facto da sua harmonia ser completamente irregular origina uma incompreensão musical, isto é, as músicas não ficam, de todo, no ouvido. São, no entanto, composições únicas e, para algumas pessoas, criações excepcionais.
Mas vamos mais longe para tornar as composições aleatórias completamente únicas. Nas composições Serial Singer anteriores (01, 02 e 03), considerámos apenas as notas aleatórias. O que acontecerá se agora considerarmos também os tempos de cada nota aleatórios? Também é possível gerar números aleatórios para os tempos se dividirmos cada um dos doze compassos em 16 partes (cada uma das partes vale ¼ de tempo, isto é, uma semi-colcheia) de modo a que, no final, somem 192 quartos de tempo, ou seja, 16 por compasso.
Os resultados são ainda mais artísticos:



Ou até:



E, porque não, uma outra partitura do mesmo género das anteriores?




Agora que já começamos a dominar a técnica, podemos completar ainda mais a nossa música serial introduzindo no cálculo aleatório pausas com diferentes durações, duas vozes na pauta da mão direita e acompanhamentos com acordes na pauta da mão esquerda. Uma interpretação adicional com dinâmicas e andamentos permite transformar o nosso tema aleatório numa obra-prima:




Será então a Arte uma potência exclusiva do homem? Ou teremos que dividir essa nossa apetência com os nossos amigos computadores? Não pode haver polémica alguma. Não faz sentido. Mesmo que se tente há sempre quem argumente que não se pode fazer Arte sem os instrumentos adequados, nos quais, porque não, não incluir o computador?! Para mim, no entanto, esses argumentos não são necessários. A Arte está nos olhos de quem a vê, ouve, toca, cheira ou prova. Nada mais. Considero que as sete obras que o meu computador criou para este post são, sem dúvida, formas de Arte. Formas de uma Arte muito especial, para ser mais conciso. Aos meus ouvidos, no entanto, música alguma das que figuram aqui preenchem aquele vazio especial que nos leva a pôr um CD no leitor, a ligar o rádio no carro ou a ir a uma concerto. São só músicas, nada mais.


segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

A Marca do Oito Deitado

O infinito… Um conceito abstracto muito real, na verdade! O que há para dizer acerca do infinito? Por incrível que pareça, há mesmo muita coisa.

A verdadeira ideologia por detrás do infinito foi concebida por Georg Cantor, matemático russo que viveu entre os séculos XIX e XX. Foi ele o autor dos fundamentos que estão por detrás das modernas Teorias dos Conjuntos, que, actualmente, se dividem em duas categorias: Cantorianas e Não Cantorianas. No entanto, ambas assentam em conclusões tiradas pelo matemático russo.
A temática do infinito tem imensas repercussões na filosofia humana. A ser verdade que, por exemplo, o nosso universo é infinitamente grande, originam-se uma série de consequências que afectam indubitavelmente os ideais do nosso comportamento, da nossa forma de pensar e até da nossa religião. Mas deixemo-nos, por agora, de filosofias e passemos à simples exposição do infinito.
Segundo Cantor um conjunto infinitamente grande só o é se se puder colocar em correspondência biunívoca com alguns dos seus subconjuntos. Pode parecer uma definição complicada, sobretudo se não conseguir contextualizar os seus conceitos, mas, na realidade, é uma definição muito simples, basta saber o que quer dizer “correspondência biunívoca”.
Imaginemos, por exemplo, o conjunto dos números inteiros positivos menores que 10, ao qual chamamos conjunto A.
Em matemática escrevemos A = { 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9 }.
Podemos agora fazer um esquema que representa o conjunto A da seguinte forma:

 
Se agora multiplicarmos cada elemento do conjunto A por 3, por exemplo, obtemos o conjunto B constituído da seguinte forma:
 
 
A aplicação (x 3) sobre o conjunto A é uma aplicação biunívoca uma vez que a cada elemento de A corresponde um e um só elemento de B e cada elemento de B é correspondido por um e um só elemento de A. A título de exemplo, as seguintes correspondências não são biunívocas:


Depois de perceber o que significa “correspondência biunívoca” (os alunos de matemática também lhe poderão chamar função bijectiva) é muito fácil perceber agora um teorema muito simples que afirma que dois conjuntos têm o mesmo número de elementos se existir uma correspondência biunívoca entre eles. Note que, nos exemplos anteriores, o único par de conjuntos com igual número de elementos é o par A e B onde se definiu uma correspondência desse género. Quando é impossível criar essa correspondência então os dois conjuntos têm uma quantidade diferente de elementos.
Quantos elementos terá então IN? O conjunto IN é o conjunto dos números naturais que são os primeiros que aprendemos (1, 2, 3, 4 e por aí adiante). Ora toda a gente sabe que não existe um último número, não é verdade? No entanto, existem vários tipos de infinito e, portanto, Georg Cantor decidiu afirmar que IN tem  אo elementos. Cantor utilizou o símbolo א (letra “aleph” do alfabeto hebraico) para representar o infinito e provou que o infinito “mais pequeno” que existe é אo correspondente à quantidade de números naturais.

Agora sim, vai começar a acção: IN é um conjunto infinito e, por isso mesmo, existe uma correspondência biunívoca com alguns dos seus subconjuntos. Basta pensar, por exemplo, na correspondência (x 2) sobre todos os elementos de IN:


O conjunto IP, como facilmente se pode ver, é constituído pelos números inteiros pares e, portanto, é um subconjunto de IN (note que IN contém os números pares e os números ímpares positivos). Mas se pudemos criar uma correspondência entre os dois conjuntos, então IN e IP têm o mesmo número de elementos. Ora se IN tem אo elementos, então IP tem também אo elementos. Mas como é possível? Se o conjunto IP está contido no conjunto IN não deveria ter menos elementos? De facto, uma primeira abordagem lógica deveria mostrar que metade dos elementos de IN são pares (e portanto são elementos de IP) e outra metade são ímpares (pertencentes ao conjunto que designamos por II). No entanto esta conclusão é incoerente com os resultados de Cantor. Na verdade, o número de elementos do conjunto II é também אo e, portanto, conclui-se que אo + אo = אo , uma vez que o número de inteiros positivos pares somado com o número de inteiros positivos ímpares será o numero de inteiros positivos.
Melhor ainda, se retirarmos a IN os elementos do conjunto IP, obtemos o conjunto II e, portanto, אo אo = אo . Fantástico, não???
Cantor assumiu que um infinito maior que אo era a quantidade de números reais (os números do conjunto IR) que corresponde ao número de pontos de um segmento de recta (na realidade é também o número total de pontos de uma recta, de um plano ou de um sólido, isto é, é o número de pontos existentes em todo o nosso universo). Chamou a esse número אl.
Cantor conseguiu provar que אl = 2^אo , isto é, não é possível encontrar uma correspondência biunívoca entre um conjunto que tenha אo elementos e outro que tenha אl elementos.
Hoje em dia as teorias dos conjuntos dividem-se então em duas escolas: as Cantorianas que acreditam que não existe nenhum conjunto que tenha mais elementos que IN mas menos elementos que IR (isto é, não existe um infinito superior a אo que seja inferior a אl) e as Não Cantorianas que crêem numa infinidade de infinitos existentes entre אo e אl. Cantor dedicou os últimos anos da sua vida a tentar provar que, na verdade não existem infinitos entre אo e אl (a chamada “hipótese do contínuo” que Paul Cohen, só na metade do séc. XX, demonstrou ser indemonstrável a partir dos conceitos existentes na teoria dos conjuntos). Lamentavelmente teve um final de vida infeliz originado pela depressão que despoletou do seu fracasso.